Bissexualidade em foco...
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Com transparência, é possível ter relação saudável com um bissexual, segundo especialistas
Os telespectadores que acompanham "Amor à Vida" sabem o quanto é complicada a relação entre Edith (Bárbara Paz) e Félix (Mateus Solano), de quem ela sempre cobrou mais fogo e paixão, principalmente na cama. Apesar de o vilão ter confessado sua atração por homens, também mostrou que não queria perder a mulher quando ela ameaçou pedir o divórcio. O relacionamento, portanto, não se desfez por inúmeros motivos: manter as aparências, trocas de interesses, segredos de família, mas, também, carinho e cumplicidade.
Em alguns momentos da trama de Walcyr Carrasco, há a impressão de que Félix nutre algum tipo de sentimento sincero pela mulher. Seria ele bissexual? Ficção à parte, não é tão raro encontrar casais formados por um hétero e um bissexual que conseguem construir uma vida a dois.
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Conforme observações clínicas da psicóloga Raquel Fernandes Marques, o desejo afetivo/sexual do bissexual tende mais para a heterossexualidade ou para a homossexualidade em determinadas fases da vida.
"Na adolescência e no início da fase adulta, os relacionamentos bissexuais são mais frequentes. Depois, surge o desejo de constituir família, ter filhos e então os casamentos heterossexuais são mais comuns".
Nessa fase, é possível viver um casamento feliz, pois, em geral, o bissexual se sente realizado dentro de uma relação heterossexual. O desejo por pessoas de mesmo sexo aparece como secundário ou nem aparece, segundo ela.
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"Logo, esse casamento pode dar certo, ou não, em função de vários outros fatores que não a bissexualidade -esta pode se transformar em um problema quando o desejo homossexual voltar à tona e a sua supressão começar a trazer sofrimento", declara Raquel.
Para a psicoterapeuta Carmen Cerqueira Cesar, uma relação entre um "bi" e um hétero é viável, sim, quando existe amor e, sobretudo, sinceridade. "Tem de haver transparência para dar certo. O parceiro hétero tem de saber de tudo, porque se descobrir a bissexualidade do outro depois do casamento se sentirá traído, e com razão", afirma.
Ela diz que alguns bissexuais escolhem a relação heterossexual por amor e optam por sublimar o outro lado –ou o vivem apenas na fantasia, por meio de filmes, da internet etc. "Mas há os que procuram parceiros fora do relacionamento. Se esse for o desejo, o ideal é jogar aberto e combinar antes para ver se o outro topa", declara.
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Há casais que lidam com muita naturalidade com essas questões, pois a autoestima, a autoconfiança e o autoconhecimento de ambos e do que representa a relação proporcionam segurança e lealdade, permitindo que vivam felizes conforme regras próprias, claras e bem definidas.
"Casamentos, sejam de qual tipo forem, não se sustentam apenas pela sexualidade, mas por vários outros fatores", diz o psicólogo Klecius Borges, especialista em terapia afirmativa para gays, lésbicas, bissexuais e seus familiares e autor do recém-lançado "Muito Além do Arco-Íris – Amor, Sexo e Relacionamentos na Terapia Homoafetiva" (Edições GLS).
Segundo Klecius, as dificuldades encontradas por casais formados por um parceiro bissexual e o outro heterossexual costumam ser as mesmas dos pares convencionais: ciúme, insegurança, rotina, libido em baixa, autoestima frágil etc.
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"São problemas que costumam ocorrer quando o bissexual não lida de forma saudável com sua orientação sexual, tentando escondê-la ou sentindo vergonha e culpa. Isso pode causar muito sofrimento ao parceiro e criar uma situação de desconfiança".
Segundo a psicóloga Sandra Samaritano, os principais inimigos dessa relação são a ausência de diálogo e a falta de cumprimento da proposta individual de cada um. "Essas questões podem gerar fantasias que provocam ciúme, insegurança e, muitas vezes, infidelidade".
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A terapeuta sexual Arlete Girello Gavranic alerta para o fato de que muitas pessoas –em grande parte, mulheres– embarcam nesse tipo de relacionamento a fim de encarar um desafio pessoal. "Elas querem exercer a autoafirmação do seu poder sensual ao tentar converter o marido à heterossexualidade", diz. Negar a realidade, seja qual for a situação, é o primeiro passo para condenar a união ao fracasso.
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